quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Ele disse, ela disse

Foto: gerada pela ferramenta de criação do Bing.

Ele disse que foi espontâneo.

Ela disse que estava reparando na pinta que ele tem pouco abaixo do lábio inferior e acabou se esquecendo de puxar assunto.

Ele disse que a conversa estava ótima, mas que não via mal em tirar uns momentos para contemplação. Tinha muito a contemplar, ele disse.

Ela disse que deixou a pinta de lado quando reparou melhor naquele sorriso tímido, na boca que ainda estava vacilante sobre falar algo ou deixar que sobreviesse o silêncio; ela também estava, mas não quis dizer nada.

Ele disse que chegou à conclusão, naquele momento, de que ela era a moça mais bonita com quem já havia saído.

Ela disse que não era incomum conhecer rapazes mais charmosos que ele, mas ele era, sem dúvidas, um dos mais carismáticos.

Ele disse que perdeu a noção do tempo naquele lugar em que tudo o que existia eram seus olhos e olhos dela, ambos os pares se atraindo e tragando-os para si.

Ela disse que não sabe qual música estava tocando de fundo.

Ele disse que também não faz a menor ideia.

Ela disse que não sabe se foi antes ou depois de pedirem as bebidas.

Ele disse que ela foi a primeira pessoa que pareceu notar a pequena cicatriz abaixo do seu olho direito.

Ela disse que ficou curiosa quanto àquela minúscula cicatriz, mas não quis quebrar o silêncio para perguntar.

Ele disse que o silêncio acalmou seu coração, antes disparado, tranquilizando-o por inteiro.

Ela disse que o silêncio a embalou e a colocou numa posição de conforto como nunca tinha sentido em um primeiro encontro.

Ele disse que não havia como se cansar de admirar cada detalhe do rosto dela; particularmente, quando os olhos deixavam, ele sempre voltava para as bochechas e para a ponta do nariz.

Ela disse que o rosto dele ia se tornando mais lindo a cada segundo.

Ele disse que tinha centenas de assuntos que queria conversar com ela – já até havia imaginado alguns diálogos na sua cabeça –, porém, a seu ver, isso podia esperar.

Ela disse que não planejou pegar na mão dele, simplesmente aconteceu.

Ele disse que não planejou pegar na mão dela, simplesmente aconteceu. E quando os dois viram, estavam com os dedos entrelaçados.

Ela disse que a cor dos olhos dele era verdadeiramente única.

Ele disse que nunca gostara dos seus olhos, de um castanho tão comum; mas em nenhum momento sentiu vergonha.

Ela disse que também não sentiu vergonha, ao contrário, queria que ele visse o que havia além daquilo que sempre admiravam ou rechaçavam.

Ele disse que às vezes percebia pessoas ao redor observando curiosas, mas as ignorava completamente.

Ela disse que não foi difícil esquecer que estavam em um restaurante.

Ele disse que esperava que um incêndio não começasse perto deles, pois eles demorariam bastante para notar.

Ela disse que a mão dele era cálida e um pouco áspera.

Ele disse que de vez em quando o sorriso dela se alargava com leveza, e nesses momentos ele se arrependia de não ter consigo uma aliança.

Ela disse que tudo aquilo era uma loucura, no entanto era uma loucura que estava adorando.

Ele disse que sua impressão era que naquele tempo a pôde conhecer melhor do que se tivessem passado horas jogando conversa fora.

Ela disse que entendeu muito dele enquanto seus olhos não podiam – e não queriam – fugir dos dela.

Ele disse que sempre gostou de observar a natureza desabrochar; e ali à sua frente estava a obra-prima entre todas as coisas mais belas do mundo, desabrochando sob seu olhar atento.

Ela disse que gostava de ir em museus e contemplar graciosas estátuas em seus mínimos detalhes.

Ele disse que a pupila esquerda dela era um pouco maior.

Ela disse que era verdade.

Ele disse que foi como um beijo, mas de olhos bem abertos.

Ela disse que foi bem melhor que muitos beijos.

Ele disse que ali teve o impulso de pedi-la em namoro, porém achou cedo demais.

Ela disse que teria aceitado.

Ele disse que tinha esperanças de que o restaurante fechasse e simplesmente os esquecem lá, para que eles pudessem continuar se encarando noite afora.

Ela disse que naturalmente apoiou o rosto em sua mão, como quem se prepara para ficar na mesma posição por horas a fio.

Ele disse que havia uma beleza no fundo dos olhos dela que, por fim, o deixou sem reação.

Ela disse que a graça daquele instante era que nenhuma ação ou reação eram necessárias.

Ele disse que não sabia as regras.

Ela disse que não havia regras.

Ele disse que começou a ficar receoso sobre a hora em que aquela conexão iria se romper e a magia talvez se esvanecesse.

Ela disse a ele que não se preocupasse com isso agora – e o fez ainda em silêncio, apenas com o olhar.

Ele disse que se acalmou.

Ela disse que sorriu.

Ele disse que aquele sorriso o iluminou por dentro.

Ela disse que sabia que ele sentia o mesmo.

Então ele disse...

Então ela disse...

Até que eles perceberam que não precisavam dizer mais nada.